sábado, agosto 27, 2005

Amor Proibido IV

É uma desordem dos tempos. Simples assim: hoje nós seríamos mais felizes no que nos faltou ontem. Mas o agora é nosso passado próximo que ainda não enxergamos, indeterminado. Eu não fui tão errado, nós não estamos tão errados, não escolhemos o tempo errado, o tempo também nos escolhe. Qualquer tempo é um início a menos que se deseje seu fim. Nós poderíamos até esquecer tudo isso que passou e eu ficava aqui brincando de ter treze anos e voltar a descobrir, lentamente, todos os seus traços que perseguiram os meus sonhos adolescentes. Então eu assistia todo esse filme recomeçar em algum lugar desconhecido entre seus olhos e o cinema que existe dentro destes - os meus. Perdoe-me se não escrevo nossa história como você acha que você teria escrito. Interpretar é isso, é acreditar. Você não entende porque acreditei em você, mas eu não acreditava era em mim. Eu te interpretei e fui culpado por essa inocência. Mas eu tinha mesmo que ter te perdido completamente para não ter que passar a vida inteira me cobrando que te perdi por pouco. Eu não fui forte. Forte como agora, como um pouco antes de agora, exatamente no instante que você me procurou. Depois daquele instante, meu corpo se desgarrou de um chão onde eu tinha me prendido nos últimos anos. Prendido tanto que já desconhecia a possibilidade de cortar minhas raízes dele. Eu quase voei. As sensações que me seguiram depois já foram bem diferentes - algumas foram carregadas de uma felicidade-infantil, outras vezes um pouco mais escuras e com uma dose moderada de tristeza justa; mas foram todas descendentes daquele mesmo instante -. Eu sei que você tem um medo escondido de me machucar, mas esquece que eu te entendo perfeitamente. Eu me desespero no seu equilíbrio-irresponsável. Nossa compreensão abastece minha capacidade de enxergar, mesmo tão distante, as respostas na profundeza de seus olhos. Se tirassem música de nossas conversas daria uma melodia suave. E o meu desejo de concluir nosso passado a escuta, em silêncio.

Agora, a minha sede de dias alegres disputa com essa distância cretina e uma razão inocente que você acha que afastam nossos caminhos. E eu fico aqui tentando lhe enviar poesias por nuvens e decifrar os seus próximos passos - que são leves como a sua voz ao telefone - enquanto o destino, senhor dos amores, brinca de fazer o tempo zombar de sentimentos.


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quarta-feira, agosto 24, 2005

20 conselhos que poucas pessoas lhe dariam.

1)Brinque com seus problemas.
2)Acredite no impossível.
3)Arrisque mais.
4)Beba.
5)Cante com a música.
6)Faça um novo amigo todos os dias.
7)Faça planos sem ter medo de se machucar.
8)Nunca tenha pressa.
9)Trabalhe com gosto.
10)Mude, mude, e mude denovo.
11)Converse com o pinguço do bar mais próximo de sua casa.
12)Seja besta.
13)Faça da maneira errada de vez em quando.
14)Escreva.
15)Se perca.
16)Assista desenho animado.
17)Nunca marque hora pra voltar pra casa.
18)Viaje mais.
19)Torre grana.
20)Morra de amor.

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terça-feira, agosto 23, 2005

Fabricio Carpinejar


Reserva de Chuvas

"Na escola, zombaram de minha pronúncia torta,
ameaçaram-me com canivetes no recreio.
Assisti a covardia crescer, aquietado no fundo da sala.
Durante anos, contive o veludo áspero da pata,
a soleira da pata, a vogal da pata.
Preparei a vingança pelas palavras.

Roubei o dízimo, enrolei o papel seda
dos versículos para fumar tuas promessas.
Pisei em teu rosto com a luz suja de um livro.
A neblina me perseguiu enfurecida
e não viu que estava nela.

Peço desculpas como uma criança,
as mãos algemadas
na inocência nociva.

Como enganar os gestos?
Minha vontade de abraçar
esgana.

Todos meus erros descendem do excesso,
não da penúria.

Deus, será que tua água
vem da sede do homem?
Será que nossa sede é potável?

As diferenças nos assemelham,
o único vizinho do mar é o abismo.
Estou extremamente perto
e morro distante.
Mora numa morte emprestada.

Cerca-me da cegueira,
tal relâmpago que acende o bosque
para as aves pousarem nele.

Cerca-me da cegueira,
desapegando do que não vi.

Cerca-me da cegueira,
a fidelidade do vento é testada no naufrágio.

Cerca-me da cegueira,
como uma fruta apanhada com os dentes.

Cega-me.
Meu desespero fracassou
ao passar a noite em claro.
Fez amizade com as sombras."

Fabrico Carpinejar

Ps: Mais uma de minhas fontes de inspiração

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sexta-feira, agosto 12, 2005

Palavras Mudas - IV

Mais algumas curiosidades da linguajem não verbal

1)Um sorriso sincero nasce dos olhos. A boca acompanha.
2)Mãos falam.
3)A intimidade de um abraço não deve ser medida pela força dos braços, mas pela superfície de contato dos corpos.
4)Não é verdade que calar significa consentir.
5)Não se conhece profundamente uma pessoa pelo que ela fala, mas pela expressão que acompanha o que ela fala.
6)"Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação"Mario Quintana

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segunda-feira, agosto 08, 2005

Pensamentos Soltos - II

Fazer o contrário também é uma maneira de se descobrir a forma certa.

Não me doem tanto os momentos em que errei. Me doem mais os que eu quase acertei.

Todo tiro sai um pouco pela culatra.

Eu comecei a achar minhas respostas depois que parei de me perguntar.

As vezes confundimos nossos desejos com os desejos dos outros.

Não tente entender demais a vida. A vida também se confunde.

Existem tristezas que mais me parecem má vontade de ser feliz.

Os enganos nos permitem descobertas acidentais.

Se você nunca der crédito às pessoas nunca achará alguém em quem confiar.

Não se preocupe se te doem as vezes que foi humilde demais com alguém. Isso passa. Mais difícil é esquecer das vezes que fomos orgulhosos demais.

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domingo, agosto 07, 2005

Palavras Mudas - III

O que nos faltou aprender sobre o outro? Não foi falta de entendimento que nos distanciou, foi o medo de entender. Nossos olhos entendidos, nossos corpos entendidos. O que a gente entende com o corpo não se traduz, seria mentir. Nós nos sobrecarregamos de traduções mal mentidas. Eu não te conheci pelas coisas que você me dizia, mas pelo desenho dos seus olhos que acompanhava tudo o que me dizia. Meu erro foi não ter descoberto antes que a verdade também estava na recíproca. Eu me atrasei com você, me perdoe. Eu te transbordei de palavras nos momentos que mais cabia meu abraço ao som do mesmo cd que sempre gostamos de ouvir juntos. E te abracei sem saber o que dizer quando você queria escutar, essas mesmas coisas para as quais sempre inventamos tantas mentiras. Depois da primeira vez que eu te abracei parece que meu corpo sofreu um impulso químico e absorveu um pouco da sua temperatura morna. E se habituou com esse aquecimento que ainda vive dentro de mim. Agora sofre crises de abstinência quando dá por sua falta. Se eu calasse não iria te ferir, me enganei. Nossas mentiras, na verdade, eram tentativas quase bem sucedidas de não nos machucar. É uma pena. Nós acabamos aprendendo a escutar nossas palavras mudas.

Coloco, agora, novamente o cd no som do meu carro até me dar o impulso de desligar na faixa que você sempre pedia para repetir. Não ponho outra. Deixo que o som e seus vestígios que insistem em morar dentro do meu peito, ambos, se calem. Nossas partes sobreviventes no corpo um do outro estão mesmo condenadas a este meu-seu eterno silêncio, ensurdecedor.

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quarta-feira, agosto 03, 2005

O vício


Nunca bebeu. Sempre teve horror a cigarro. À medida que o tempo passava ficava cada vez mais contra a qualquer tipo de vício. Foi surpresa da família quando parou de comer carne vermelha. E cortou mais ainda a alimentação. Era quase um naturalista. Quero estar livre de porcarias, dizia. Só tomava sol antes das dez, em horário recomendado. Começou a mudar ainda mais. Proibiu doces em casa, sorvete, biscoitos, guloseimas. As crianças reclamavam. Começou a regular o vídeo- game do mais novo e a internet da mais velha. Tinha pavor a vícios. Era contra jogos. Proibia baralhos em casa, dominó. Tinha horário certo de assistir tv. Parou de usar ar– condicionado, leu que fazia mal. Parou de ler todo dia, pra não viciar. Á noite então, ao deitar começava a se sentir estranho. Começou a perder o sono, algo o incomodava. Uma sensação diferente, preocupante. Trocou o café pelo suco, o açúcar pelo adoçante. Mas a insônia lhe persistia. E aumentava a cada noite. Perdeu o vício de dormir à tarde, assistia menos à novela, tinha hora certa de ir pra cama. Parou de comer de noite, ouviu dizer que fazia mal. Parou de tomar refrigerante-diet, por causa da cafeína. Mas aquela sensação não foi embora, e o deixava acordado. Mexia-se na cama, perdia a concentração. Mudava de posição, mudava de travesseiro, nada adiantava. Trocou o suco pela água, parou de sair à noite de Sábado, mesmo a esposa sendo contra. Parou de vez de assistir novela. Depois já não assistia mais tv. Até o rádio pouco escutava. Perdeu todos os costumes ruins. Mas algo ainda o incomodava, e tirava seu sono. De madrugada pensava no que havia de errado, inquieto na cama. Tinha algo que o deixava aflito. Não sabia o que era. Tudo estava em ordem, pensava. As contas estavam em dia. Era um exemplo de pessoas saudável. E o melhor de tudo: não tinha nenhum vício. Era o seu maior orgulho. Homem livre de vícios! Mas ele não percebia é que lhe restava sim, um grande vício. Um único vício, que nunca perdia. E estava o matando. O vício de se preocupar com tudo.

Participação especial na adaptação deste texto do amigo Esdras Barrteo.

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