quinta-feira, outubro 06, 2005

Palavras Mudas - V

O ruído do ar-condicionado era impróprio ao silencio apreensivo do carro. Ele apenas aguardava as palavras dela, como quem aguarda uma sentença. Esperou. Esperou. A falta de diálogo aumentava seu incomodo, mas nada disse. O momento despertava insegurança, mas conteve a emoção em algum lugar incerto entre a garganta e o peito. A ausência de palavras dela o confundia. Os olhos que ele aprendera a desvendar carregavam uma paz incompreensível, pensou. Ela o tocou. Delicadamente, para somar surpresa. Respirou sem pressa. O olhou sem medo. E juntou à face uma daquelas expressões femininas indecifráveis, indescritíveis. Não era raiva. Mas também não sorria. Ele apenas continuou assistindo aos seus movimentos, tranqüilos. No fim de alguns segundos ela voltou a se mexer. O beijou, com sutileza. Na face. E saiu do carro calmamente ao invés de falar algo, virou de costas em vez de dizer adeus, encostou a porta em vez de batê-la. Ele continuava imóvel. Calado. E já não era mais forte o suficiente para esconder a emoção. Como poderia agir dessa maneira, como se nada estivesse acontecendo? Neste instante, só lhe restava observar, pela ultima vez, o andar lento dela até a porta de sua casa, o mesmo de sempre. O beijo tinha sido a despedida.

Era um fim de tarde cinza de domingo, a rua estava vazia, o vento forte anunciava a previsão de chuva para o começo da noite. Antes de dar partida ao carro e inundar seus olhos, ele pensou alguns minutos consigo. Nunca se sentira tão agredido em toda sua vida.

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30 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

texto lindo. E profundo...Aliás, vindo de voce nada disso é novidade.
Beijo da Gabi

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 09:30:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Agressões simbólicas. Metafóricas. Gostei! Abs.

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 09:52:00 BRT  
Blogger Blue Woman disse...

eu assisti uma peça de teatro que tratava justamente desse momentos de silêncio, que não dizem nada, às vezes tudo. E confundem a cabeça da gente!

bjo

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 10:00:00 BRT  
Blogger Helena disse...

"mas conteve a emoção em algum lugar incerto entre a garganta e o peito" - lindo, Fernando!

besos,

Helena

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 11:20:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Manter-se impassível diante de um derramamento silencioso de emoções se limita a 2 hipóteses: ou se trata de refinadíssimo fingimento, ou de perda irreversível da capacidade de ouvir com o coração. Como não acredito nessa última, penso que a menina é,de fato, uma grande atriz! Não gostei nada dela. Rs.. Excelente texto! bjos!

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 12:15:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

detesto saber que casos de amor acabam!

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 15:51:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Caro Fernando,
que sufoco este texto...
Realmente: é preciso palavras para as despedidas...
Até...
Um abraço

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 18:39:00 BRT  
Blogger I disse...

Fernando quando terminei a leitura do post, senti (estou sentindo ainda) a dor do protagonista desta história.Um texto tão(aparentemente) simples e tão emotivo..um beijo

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 20:20:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

definir adeus é sempre complicado. mesmo em texto poético. é possível imaginar a expressão estupefata do moço....e é possível ouvir as definições de vida que a moça do texto deixou com ele. o texto, ainda que não mencione, fala de escolha. de decisão. não d efim. mas de outro rumo. é quando todo mundo pára para pensar melhor. gostei muito, Fernando. e continuo aqui, assim, observando. meu beijo, DD.

quinta-feira, 6 de outubro de 2005 às 20:36:00 BRT  
Blogger [Manú] disse...

As vezes palavras não ditas ferem mais do que as ditas.Quando o assunto é o amor,quando o local é o coração...puxa!Como parecemos indefesos...Beijo moço!

sexta-feira, 7 de outubro de 2005 às 01:19:00 BRT  
Blogger douglas D. disse...

Sim, palavras mudam. Mudam.

sobre o que vc comentou no blog, algumas vezes minhas imagens são infância.

sexta-feira, 7 de outubro de 2005 às 02:22:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

É a morte do caminho, experimentamos inermes, mas há o próximo passo, há sempre algo que nos aguarda na esquina mais próxima. Te beijo.

sexta-feira, 7 de outubro de 2005 às 07:42:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

o silêncio pode ser paz e também aflição. que aflição o seu texto. gostei muito. beijo

sexta-feira, 7 de outubro de 2005 às 10:49:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Olá!
Obrigado pela tua visita ao meu blog, venho cá retribuí-la!
Ao chegar aqui fiquei surpreendido!
Gostei do teu modo de escrita muito bom mesmo, chega a ser intenso. E li por aí num dos comentários, que quando acabamos chegamos e pensar que sentimos a dor dele!
Gostei mesmo muito, continua!

sexta-feira, 7 de outubro de 2005 às 19:05:00 BRT  
Blogger Rubens da Cunha disse...

Olá Fernando,
obrigado pela visita. Teu texto me cunhou um desespero, estes abismos silenciosos que se interpõe entre as pessoas. O final é de uma clareza e de uma dor sem tamanho.
abraços
rubens

sexta-feira, 7 de outubro de 2005 às 20:03:00 BRT  
Blogger Cláudio B. Carlos disse...

Olá Fernando!
Deixarei aqui um comentário mudo.



Fui.


CC.

sábado, 8 de outubro de 2005 às 01:07:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Intenso!!! Essa palavra define bem... o silencio é muito dificil de suportar... disperta curiosidade, adivinhação. Belo texto, fernando, como semrpe..

sábado, 8 de outubro de 2005 às 05:12:00 BRT  
Blogger GNM disse...

Muito bom mesmo!

Fiquei deveras envolvido!

Bom fim de semana!

sábado, 8 de outubro de 2005 às 10:58:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Compreensão e amor precisão andar de mãos dadas para encontrarem a felicidade.

Muitas vezes o que parece ser uma agressão é um sinal de pedido de socorro.

Marcas de ressentimentos não faz bem a ninguém e pessoas especiais e belas não merecem ser contaminadas com tal veneno.

sábado, 8 de outubro de 2005 às 14:35:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Sou exatamente assim, na hora H me falatam todas as palavras e eu simplesmente viro as costas e vou embora...

sábado, 8 de outubro de 2005 às 14:42:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

O silencio é tao importante como qualquer outra coisa. Eu adoro o silencio! É precioso.
Um beijo*

sábado, 8 de outubro de 2005 às 16:26:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Agredido bille?
Os sentimentos provocados por uma mulher são incalculáveis, por isso que as amo.

Belo texto.

Um abraço,

Esdras

sábado, 8 de outubro de 2005 às 17:58:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Gostei!!
Já passei por isso e realmente dói muito!

Até amigo!!

Ass: Guilherme.

domingo, 9 de outubro de 2005 às 13:32:00 BRT  
Blogger susana disse...

blog criativo
escrita cativante

um abraço,
pastora de estrelas

domingo, 9 de outubro de 2005 às 18:30:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Este comentário foi removido por um administrador do blog.

segunda-feira, 10 de outubro de 2005 às 06:15:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Este comentário foi removido por um administrador do blog.

segunda-feira, 10 de outubro de 2005 às 06:21:00 BRT  
Blogger Danilo de Castro disse...

Ae man, foi lendo seus textos que comecei a criar gosto por tal arte, espero um dia chegar perto deste teu talento.

Abraços.

segunda-feira, 10 de outubro de 2005 às 10:28:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

Fernando
Solidao se cala, como a vida que muda. Fatos amorosos não podem ser reprimidos e quando possível devem estar explícitos, esqueça o pudor das palavras e solte o verbo!!!
Fui contente por saber que ainda irei voltar!!!
Um Abraço,

Marcelo

segunda-feira, 10 de outubro de 2005 às 13:03:00 BRT  
Anonymous Anônimo disse...

É o silencio doi, mas existem pessoas que não sabem ou preferm não lhe dar com situações difícies.
Eu prefiro o diálogo!
Abraço.

segunda-feira, 10 de outubro de 2005 às 15:01:00 BRT  
Blogger Fernando Palma disse...

"*obs. Comentários excluídos = spans.

segunda-feira, 10 de outubro de 2005 às 15:08:00 BRT  

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