A solidão - IV
Baseado em um texto de Princess
Encostou o sofá rente a tv, de costas para o silencio quente do apartamento. Deitou abraçada com uma sede que carregava por dentro. Um desejo sem destinatário. Juntou seu corpo de menina pré-adolescente escondendo-o atrás dos lençóis; e se deixou abandonar, como quando abandonava sua boneca em uma prateleira da estante.
Pôs um filme. Disney .
O início fazia os novos personagens confundirem a calma do apartamento. Mariana foi se deixando esquecer de seu próprio esquecimento. Deixou-se caminhar entre cenários desconhecidos, em liberdade. Sem rumo, sem saída, sem chegada. Sem dono. Sem limite para viver, para amar.
Suas fantasias cabiam dentro de uma caixa de imagens encantadas. Deixar-se levar pelos filmes fantasiosos lhe trazia uma sensação excitante, desconhecida. Viciante. Era como adormecer, mas sem fechar seus olhos. Como navegar por nuvens sem sair do lugar onde estava. Mariana não esperava pela noite para sonhar, adormecia por dentro durante as tardes. Ela não sonhava com o que via na tv, a tv era seu próprio sonho. Seu único. Sonhava o que não se permitia viver. Vivia o que não conseguia sonhar. Ela não acreditava em realizações de sonhos, os sonhos eram sua maior realização. Mariana tinha uma menina alegre dentro de si, agitada, cheia de vontades, que vivia bem longe daquela sala vazia de seu apartamento. Mas a guardava para ser usada quando houvesse alguma chance.
O desfecho do filme era o ápice de suas tardes em frente à tv. E o final significava para ela não só um trecho especial do filme, mas de sua própria existência. O sorriso acompanhou o destino do personagem que não só a divertia, mas lhe ensinava sobre sonhos e paixões. Mariana aprendeu a amar em frente à televisão. Aprendeu a coragem e o medo. O encanto e o desencanto. O bem e o mal.
A canção se espalhou entre sua memória que guardou aquele -mais um- final feliz como se fosse seu. E guardou o personagem como se fosse um novo amigo. A história como se fosse real. Neste momento Mariana já não distinguia sonho de realidade. Fantasia de comum. E adormeceu completamente para dentro de si. E se alguém pudesse lhe ver neste pequeno instante acharia que era apenas uma menina assistindo televisão.
Ps: Mais sobre este personagem no texto A solidão - II
Marcadores: pequenos textos, solidao, textos poeticos
19 Comentários:
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Exclusão = span.
Esta sede que carregamos por dentro parece que não seca.Quanto mais sonhamos,quanto mais vivemos,mas a boca está seca,ávida por beber da água da vida.Acho que o mundo devia ser mais colorido,feito aqueles velhos pogramas de fim de tarde que passavam na tv(sempre ela)as vezes me sinto assim como a personagem do post,fazendo amigos telepáticos/televisivos porque os de fora já parecem não a compreender mais...Será o mundo algo compreensível?
Beijos Nando!Adorei o texto!;)
Esse texto tem tudo a ver com a frase 'inspirante': "Não tive amigos imaginários, fiz amizade com a imaginação." Meu beijo Fernando.
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Solidão misturada com esses sonhos todos, melhor ainda quando acordados, uma boa receita conhecida.
Beijo meu.
Um texto em que a personagem, sonha pensando que não está a sonhar é um sonhar acordado. É talvez a tranposição da Mariana menina na Mariana adulta. Agradavel o texto. Cumprimentos.
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Este texto me lembrou aquele problema de amigo imaginário. Muito bom!
Abraço
A Mariana é uma sortuda! É tão bom sonhar...
Uma excelente semana!
Olá Fernando...Obrigada mais uma vez pela visita e pelo comementário tão oportuno. Às vezes é impossível separar raiva da decepção..mas sempre estou disposta à desafios...é isso que impulsiona a vida...mesclar a realidade com fantasia...que texto lindo...e muito bem escrito.
Deixar-se levar pela ficção...pelo balanço e ritmo de um sonho...perfeito...
abraço,
Caro Fernando,
a Mariana é minha amiga imaginária.
Gostei, o texto é encantador.
Sinceramente, acho que, em Mariana, existe um linha muito tênue entre sonho e fuga. Até que ponto "adormecer por dentro" é, de fato, sonhar? Será que o Mickey sabe essa??
Adoro a personagem a Mariana! bjos!
Oi Fernando,
obrigado pela visita. Este teu olhar sobre a infância me deixa meio tonto: ao mesmo tempo em que carrega uma certa alegria, estampa uma angústia intensa. Gosto muito da dubiedade que teu texto apresenta.
abraços
" ...adormecia por dentro" quantas vezes não nos vemos exatamente assim - por motivos e formas diversas. que bonito. beijos.
Belo texto...
Realmente há muitas Marinas no mundo, a sonhar acordadas...
fantástico!!!
...
impressionada
...
desejo sem destinatário
frase de peso...
...
sem palavras
...
minha filha chama-se Mariana.
bjos
A Mariana parece ser um aboa menina....Adorei o texto, e o personagem também...
Beijo Fernando !
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