Em uma dessas noites - II
-Vou pegar duas Brahmas para nós
Juca apenas consentiu movimentando a cabeça. Já era tradição entre ele o amigo. Sempre se oferecia antes para costear as bebedeiras. Sentados na parte interna da loja de conveniência do posto, naquelas mesmas cadeiras que já aprenderam o formato de suas costas, os dois esperavam que o efeito das cervejas animasse o começo de mais uma noite.
-Sabe que eu soube que Bete está com umas amigas novas?
-Amigas de Bete!?! Além de baixinho você é sem juízo! Chega desses esquemas com aquelas meninas chatas. Eu quero novidade! Você às vezes me decepciona Thiaguinho!
A vítima do protesto apenas assistia à manifestação rebelde do amigo . Não se dava mais o trabalho de tentar revidar às grosserias tão comuns vindas dele, já a tomara como costume na relação de melhores-amigos dos dois.
-E então qual é a idéia?
-Me empresta seu celular, o meu está sem créditos.
A ligação era para Cecília, que conheceram na sétima série e que mudara de colégio um ano depois. Juca era sempre o mentor das idéias na relação dos dois, o líder que dava as coordenadas , o contato deles com as garotas. Com o fim da ligação o explicou, como sempre em poucas palavras, a festinha que havia marcado na casa da tal menina com algumas colegas e aproveitava a conversa para manda-lo buscar mais bebidas na prateleira do freezer. “A festa” na realidade, era simplesmente um nome-pretexto, dado à reunião de meninas e rapazes desta faixa de quinze e dezesseis anos como eles, em suas casas. Quando os pais não estavam por perto, é claro.
O táxi andava num ritmo desacelerado, buscando o endereço exato descrito pela colega antiga. A sorte foi que a menina morava no Cidade Jardim, bem próximo ao posto do Itaigara onde estavam. O preço poderia ser negociado a menos de dez reais. Neste tempo de mesadas qualquer trocado gasto fazia falta, a grana era curta. O toque da campainha trouxe três das meninas até a entrada do apartamento. Nesta idade, elas sempre andam assim, acompanhadas umas das outras, nunca sozinhas, mesmo pra atender à porta. Quando a dona da casa os levou à sala os dois não puderam segurar os sorrisos: eram seis, todas lindas. As bebidas espalhadas pela mesa e o som ligado com o cd de música eletrônica enchiam-nos de expectativa. A noite ia ser boa. Só o que não lhes encheu os olhos foi a chegada de mais quatro rapazes, alguns minutos depois. Era querer demais que tudo aquilo só os favorecessem. Enquanto Thiago sentava ao sofá para tentar timidamente se entrosar com elas o amigo-pinguço buscava nas opções a bebida mais forte para servir a todos. Foi a surpresa do baixinho quando uma das meninas tirou de seu bolso o frasco com o nome-disfarce de Aromatizador: desde época de carnaval não via lança-perfume de tão de perto. Com seu corpo franzino já bem próximo a ela usava ao entorpecente junto ao seu desjeito de abordar à menina. Inalava numa velocidade que não deixava tempo nem pra raciocinar, inalava até perder a noção de onde estava. A rapidez com que ia esvaziando o frasco junto dela só não era maior do que a velocidade que Juca tomava a garrafa de vodka, junto da mais bonita das moças reunidas. Uma loira indescritível. Os que estavam na varanda encostaram a porta um pouco, isolando os dois ambientes. Foi quando Thiago voltou a si que notou que o amigo já beijava a loira, antes mesmo dele iniciar a planejar como iria executar o mesmo com a garota que estava em sua companhia. Ele era mesmo assim, nunca o entendera: sempre se dava melhor com tudo, era um cara de sorte, sempre ganhava as mais bonitas com pouca dificuldade. Às vezes quando tocavam no assunto respondia “Tem que beijar logo, nada de muita conversa, rapaz!”. Mas isso não funcionava para si. Só um cara maluco como Juca conseguia matar aula e se dar bem no colégio, colocar o dedo na cara de homens bem mais fortes do que ele e não apanhar. Só ele conseguia ganhar as garotas assim, sem conversar. Tocou em alguns assuntos sem importância com a menina-do-lança para quebrar o clima: tão próximos do outro casal e afastados do resto do grupo, era possível acontecer algo a qualquer momento, o que tirava a sua tranqüilidade. Foi planejando do seu modo o ataque até que conseguiu toma-la nos braços e suspirar um beijo. Mas não deu tempo de aproveita-lo. A Cecília aparecia entre os, agora, dois casais de jovens para dar a péssima notícia.
-São meus pais. Estão chegando. Só as meninas podem ficar, isso é sério!
Entre as caras de decepção e as correrias para apagar os vestígios dentro do apartamento assim foi chegando ao fim a “festinha”, pela metade. Sem ter como ir embora, abordaram a um dos convidados do evento na porta do prédio
-Dá um carona pra gente cara, pode ser até o posto do Itaigara.
O motorista-irregular de dezesseis anos com o carro roubado do pai abriu-os a porta somando-os ao banco de trás com os outros e saiu em velocidade máxima pela avenida ACM. A aventura com aquele menino bêbado no volante divertia Juca como quem estivesse numa das melhores montanhas-russas dum parque . Ria, ria... Das fechadas nos veículos que tinham o azar de cruzar com eles, dos cones-de-trânsito roubados pelo caminho, só por diversão, da freiada em cavalo-de-pau em meio à curva. Mas o que mais lhe causava mesmo o riso era a cara de medo hilária do Thiaguinho que não achava graça nenhuma naquelas atitudes irresponsáveis, daquele sujeito desconhecido. Quando finalmente pararam, saiu do carro aliviado em direção á loja do posto e se voltou para as prateleiras ao lugar que ocupa a Brahma. Mas foi interrompido, sutilmente pelo amigo, que tentava mostrar alguma compreensão pela sua expressão de nervosismo.
-Deixa comigo Thiagão. Essa é por minha conta.
E assim voltavam cada um ao seu banco da mesma mesa, no mesmo lugar, daquela mais uma noite de sextas-sem-dinheiro, sem programa e sem a mínima vontade de voltar para casa.
-E agora?
Juca olhou atento ao movimento na porta observando às pesoas que entravam, mas não tinha nada a ver com a pergunta do baixinho, apenas verificava se havia entre elas alguma moça desacompanhada.
-E agora o quê?
-Sei lá Juca...Alguma idéia?O que fazemos?
-Tsc...Bom, você tem o número de Bete ai?
Juca apenas consentiu movimentando a cabeça. Já era tradição entre ele o amigo. Sempre se oferecia antes para costear as bebedeiras. Sentados na parte interna da loja de conveniência do posto, naquelas mesmas cadeiras que já aprenderam o formato de suas costas, os dois esperavam que o efeito das cervejas animasse o começo de mais uma noite.
-Sabe que eu soube que Bete está com umas amigas novas?
-Amigas de Bete!?! Além de baixinho você é sem juízo! Chega desses esquemas com aquelas meninas chatas. Eu quero novidade! Você às vezes me decepciona Thiaguinho!
A vítima do protesto apenas assistia à manifestação rebelde do amigo . Não se dava mais o trabalho de tentar revidar às grosserias tão comuns vindas dele, já a tomara como costume na relação de melhores-amigos dos dois.
-E então qual é a idéia?
-Me empresta seu celular, o meu está sem créditos.
A ligação era para Cecília, que conheceram na sétima série e que mudara de colégio um ano depois. Juca era sempre o mentor das idéias na relação dos dois, o líder que dava as coordenadas , o contato deles com as garotas. Com o fim da ligação o explicou, como sempre em poucas palavras, a festinha que havia marcado na casa da tal menina com algumas colegas e aproveitava a conversa para manda-lo buscar mais bebidas na prateleira do freezer. “A festa” na realidade, era simplesmente um nome-pretexto, dado à reunião de meninas e rapazes desta faixa de quinze e dezesseis anos como eles, em suas casas. Quando os pais não estavam por perto, é claro.
O táxi andava num ritmo desacelerado, buscando o endereço exato descrito pela colega antiga. A sorte foi que a menina morava no Cidade Jardim, bem próximo ao posto do Itaigara onde estavam. O preço poderia ser negociado a menos de dez reais. Neste tempo de mesadas qualquer trocado gasto fazia falta, a grana era curta. O toque da campainha trouxe três das meninas até a entrada do apartamento. Nesta idade, elas sempre andam assim, acompanhadas umas das outras, nunca sozinhas, mesmo pra atender à porta. Quando a dona da casa os levou à sala os dois não puderam segurar os sorrisos: eram seis, todas lindas. As bebidas espalhadas pela mesa e o som ligado com o cd de música eletrônica enchiam-nos de expectativa. A noite ia ser boa. Só o que não lhes encheu os olhos foi a chegada de mais quatro rapazes, alguns minutos depois. Era querer demais que tudo aquilo só os favorecessem. Enquanto Thiago sentava ao sofá para tentar timidamente se entrosar com elas o amigo-pinguço buscava nas opções a bebida mais forte para servir a todos. Foi a surpresa do baixinho quando uma das meninas tirou de seu bolso o frasco com o nome-disfarce de Aromatizador: desde época de carnaval não via lança-perfume de tão de perto. Com seu corpo franzino já bem próximo a ela usava ao entorpecente junto ao seu desjeito de abordar à menina. Inalava numa velocidade que não deixava tempo nem pra raciocinar, inalava até perder a noção de onde estava. A rapidez com que ia esvaziando o frasco junto dela só não era maior do que a velocidade que Juca tomava a garrafa de vodka, junto da mais bonita das moças reunidas. Uma loira indescritível. Os que estavam na varanda encostaram a porta um pouco, isolando os dois ambientes. Foi quando Thiago voltou a si que notou que o amigo já beijava a loira, antes mesmo dele iniciar a planejar como iria executar o mesmo com a garota que estava em sua companhia. Ele era mesmo assim, nunca o entendera: sempre se dava melhor com tudo, era um cara de sorte, sempre ganhava as mais bonitas com pouca dificuldade. Às vezes quando tocavam no assunto respondia “Tem que beijar logo, nada de muita conversa, rapaz!”. Mas isso não funcionava para si. Só um cara maluco como Juca conseguia matar aula e se dar bem no colégio, colocar o dedo na cara de homens bem mais fortes do que ele e não apanhar. Só ele conseguia ganhar as garotas assim, sem conversar. Tocou em alguns assuntos sem importância com a menina-do-lança para quebrar o clima: tão próximos do outro casal e afastados do resto do grupo, era possível acontecer algo a qualquer momento, o que tirava a sua tranqüilidade. Foi planejando do seu modo o ataque até que conseguiu toma-la nos braços e suspirar um beijo. Mas não deu tempo de aproveita-lo. A Cecília aparecia entre os, agora, dois casais de jovens para dar a péssima notícia.
-São meus pais. Estão chegando. Só as meninas podem ficar, isso é sério!
Entre as caras de decepção e as correrias para apagar os vestígios dentro do apartamento assim foi chegando ao fim a “festinha”, pela metade. Sem ter como ir embora, abordaram a um dos convidados do evento na porta do prédio
-Dá um carona pra gente cara, pode ser até o posto do Itaigara.
O motorista-irregular de dezesseis anos com o carro roubado do pai abriu-os a porta somando-os ao banco de trás com os outros e saiu em velocidade máxima pela avenida ACM. A aventura com aquele menino bêbado no volante divertia Juca como quem estivesse numa das melhores montanhas-russas dum parque . Ria, ria... Das fechadas nos veículos que tinham o azar de cruzar com eles, dos cones-de-trânsito roubados pelo caminho, só por diversão, da freiada em cavalo-de-pau em meio à curva. Mas o que mais lhe causava mesmo o riso era a cara de medo hilária do Thiaguinho que não achava graça nenhuma naquelas atitudes irresponsáveis, daquele sujeito desconhecido. Quando finalmente pararam, saiu do carro aliviado em direção á loja do posto e se voltou para as prateleiras ao lugar que ocupa a Brahma. Mas foi interrompido, sutilmente pelo amigo, que tentava mostrar alguma compreensão pela sua expressão de nervosismo.
-Deixa comigo Thiagão. Essa é por minha conta.
E assim voltavam cada um ao seu banco da mesma mesa, no mesmo lugar, daquela mais uma noite de sextas-sem-dinheiro, sem programa e sem a mínima vontade de voltar para casa.
-E agora?
Juca olhou atento ao movimento na porta observando às pesoas que entravam, mas não tinha nada a ver com a pergunta do baixinho, apenas verificava se havia entre elas alguma moça desacompanhada.
-E agora o quê?
-Sei lá Juca...Alguma idéia?O que fazemos?
-Tsc...Bom, você tem o número de Bete ai?
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